terça-feira, setembro 25, 2007

Só depois...

Só depois daquela noite de verão morno, que, como sempre, passamos juntos, que, como sempre, passamos no campo, porque tu gostas, que, como sempre, fui trocado pelo jornal, pela revista, pelo romance, pela televisão, pelo jantar, pelo sono, pelas arvores, pelas fotos, pelos fogos, pelos montes, pelo calor, pelo frio, pelo sol e pela lua, tive coragem para te dizer que já não te amava, que dia após dia te traía em pensamento.

Só depois de te virar as costas, pela primeira vez sem voltar, me disseste obrigado por todo o amor que te dediquei, durante todos estes verões em que mal notavas a minha presença, mesmo quando ele já se tinha esgotado e o inventava dia após dia, noite após noite, mesmo quando te ouvia gemer de prazer físico e adormecias sem dizer boa noite.

Só depois de te pedir que não estivesses em casa quando lá fosse recuperar o pouco que me resta, que contigo partilhei sempre, mesmo quando fazias de conta que era teu, mesmo quando exigias o que não te pertencia, mesmo quando eu te pedia para teres cuidado, e não tinhas, tu me pediste para não te deixar “agora”, porque os teus eternos agoras e nuncas e sempres e aquele talvez, não te deixavam viver agora o que nunca se repetiria, recordando para sempre uma certeza de amar, que já não acontecia, mesmo quando me mentias no “amo-te” orgásmico.

Só depois de sentires o frio da cama sem mim, o vento da tempestade, que teimas fazer a tua vida ser, a derrubar todo o teu quarto, que já não é nosso, choraste a primeira pedra de gelo, que no verde ardente dos teus dos montes que tanto amas, e onde passamos todos esses verões, se derrete e evapora para o infinito longínquo onde as tuas lembranças nossas jazem, bem longe das minhas que, mesmo já não te amando, guardo no canto do meu coração, sedento de amor, que é teu e, este sim, sempre será.

Só agora ao ver-te na tumba, numa serena perfeição pálida e eterna te posso dizer, mesmo sabendo que em vão, que a raiva que nunca senti me devia ter dito que o amor não se apaga jamais.